Breno de Sant’ana, 2021.
“vinhadinho”, Fotoperformance, 50 x 70 cm.
O jovem artista BRENO DE SANT’ANA diz: “Ao longo da minha pesquisa em artes visuais, venho desde 2019 desenvolvendo trabalhos relacionados à performance, fotografia e colagem, relacionando o ambiente em que eu vivo e que eu observo com os afetos e as afecções que me atravessam como um ser contemporâneo. Assim, apresento as propostas artísticas a partir da experiência do meu corpo com o território”.
A fotoperformance “vinhadinho”, que agora integra a COLEÇÃO CALMON-STOCK, é um dos trabalhos nos quais SANT’ANA experimenta espaços nos quais transita pela cidade do Rio de Janeiro. A curadora independente Mariana Maia diz sobre esta obra: “BRENO DE SANT’ANA descreve seu “vinhadinho” como um animal de grande porte, mamífero, que tem as habilidades de fugir das emboscadas da sociedade opressora e detectar, ao longe, os preconceituosos. Na imagem vemos o “vinhadinho” em seu habitat. A periferia se transforma em uma espécie de floresta selvagem, onde vemos casas inacabadas, ervas daninhas… A persona presentificada pelo jovem performer mira a câmera com um olhar voraz e desafiador. Um corpo que deseja ser fotografado. Retorcido, quase mimetizando um veado, animal que por vezes é caça, mas é, também, o imponente gamo rei da floresta, o artista ressignifica a palavra pejorativa com toque de regionalismo,“vinhadinho”. Assim, a alcunha preconceituosa é diluída, tornando-se arma de afirmação de uma identidade…BRENO DE SANT’ANA faz o “vinhadinho” existir e resistir em uma rua de periferia e no mundo.”
Uma década antes de BRENO DE SANT’ANA nascer, em fevereiro de 1990, a intelectual italiana Teresa de Lauretis, especialista em história da consciência, proferiu nos EUA a lendária palestra “Queer Theory:Lesbian and Gay Sexualities”. Lauretis tornou-se, então, a primeira acadêmica a associar o termo “queer” à palavra “teoria”, abrindo assim caminho para um sem número de desdobramentos que impulsionariam nas próximas décadas as discussões sobre a nossa maneira de ser e viver. A palavra “queer”, em inglês, é a alcunha depreciativa usada para designar os homens homossexuais. Deriva do alemão “quer”, por sua vez vem do latim “torquere” (torcer), que significa “transversal”, “diagonal”, “obliquo”. A partir dessa etimologia, o também italiano Lorenzo Bernini (filósofo e estudioso da teoria queer da Universidade de Verona) postula que “queer” não é senão o contrário de “straight”, que por sua vez significa “direito”, “reto”. Mais: Bernini em seu livro “Apocalipsis Queer” afirma que “a partir do momento em que a heterossexualidade se associa tradicionalmente a retitude moral, (straight) ganha também o sentido de “heterossexual”. Nesse contexto, Mariana Maia não poderia ser mais precisa ao usar a palavra “retorcido” na análise da surpreendente fotoperformance.
Em Gramatologia (1967), Derrida já havia alertado que a história da metafísica – de Platão a Hegel, dos pré-socráticos a Heidegger – sempre atribuíra ao logos a origem da verdade em geral, isto é, que a verdade sempre fôra a operação de rebaixamento e recalcamento da escritura em detrimento da “fala plena” (de quem?) – ou se preferirmos uma expressão descartiana, do “cogito, ergo sum” (penso, logo existo) em relação a escritura. Na obra de BRENO DE SANT’ANA o que vemos é a superação do cogito ou da fala (patriarcal): o corpo, a ação e a arte deste promissor artista mostram que o mundo não é simplesmente “direito”, mas algo “retorcido”… E que sua performance forjada escritura como fotografia, tornada arte e batizada com um adjetivo tão poderoso quanto “queer”, adentra nossas cabeças tão vigorosamente quanto a (como) teoria.